sábado, 6 de maio de 2017

Domingo IV da Páscoa - ano A - 7 de maio de 2017

       1 – Há muitas situações que nos tiram o sono. Muitos momentos em que não conseguimos adormecer com a rapidez desejada e o sono é tão leve que acordamos cansados, parecendo que nem chegámos a dormir. Damos voltas e mais voltas e não adianta. Uma doença. A morte de alguém. Uma traição. Um negócio que correu mal. Um conflito com um colega. Um aborrecimento com um familiar.
       A falta de saúde, o cansaço, o stress no trabalho ou a falta de trabalho – e a insegurança no trabalho – tudo isso são motivos fáceis de detetar. Ansiedade. Medo de não dormir bem, de acordar sem vontade de sair de casa, de chegar de manhã e continuar tudo igual.
       Afinal de contas o que é que nos deixa mais inseguros e ansiosos? A vida não é branco e preto, mas podemos responder com segurança que é o nosso relacionamento com os outros que nos provoca medo, ansiedade, desgaste, agitação. O que os outros podem pensar de mim? Como vou reagir ao que me me vão dizer? Como me vou defender ou justificar? Como vou fazer calar o outro? Como é que lhe hei de mostrar que sei mais que ele? A conversa que tive com a minha mulher! A discordância com a atitude do meu filho! O raspanete que levei do meu pai! Como é que vou gerir a amizade com dois amigos que não se dão entre eles? Como vou exigir o que é meu por direito? Como é que vou explicar ao meu professor que não consegui estudar? Que é que a professora pensará de mim?
       Cada um de nós precisa da aceitação do outro e ser reconhecido, antes de mais, como pessoa. Há quem se imponha pela maldade, pelo poder, pela violência. Há quem se afirme pela positiva, pela delicadeza, por ser prestável, útil, atencioso. Há alunos que chamam a atenção pela assertividade em relação aos professores e aos colegas. Há alunos que chamam a atenção pelos disparates que fazem a toda a hora. Ou como quem diz, ou vai ou racha.
       2 – Neste 4.º Domingo de Páscoa temos dois modelos de assertividade, de empatia ou um modelo com dois rostos e que se multiplica por muitos rostos e muitas pessoas. Assim o queiramos. Por um lado, o Dia Mundial de Oração pelas Vocações, que evoca a figura do Bom Pastor, visualizável em Jesus Cristo. Por outro, o Dia da Mãe, que nos remete para Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, mas também para as nossas próprias mães.
       O pastoreio fala-nos de pobreza e de trabalho, de honestidade e delicadeza. Os pastores eram pessoas simples e humildes. Levavam o seu trabalho a sério, pois disso dependia a sua sobrevivência. Pessoas que lidam com animais sabem como se lhes ganha afeição. Também os pastores se tornam pessoas delicadas, conhecendo as ovelhas pelo nome, cuidando delas para que nenhuma se perca, não deixando que nenhuma se afaste com o risco de se tornar presa fácil para os animais selvagens. Guardando as suas ovelhas ou da tribo/povoação, o cuidado é semelhante. É o seu ganha-pão.
       David, antes de ser rei, era pastor. Ficou no imaginário dos judeus como uma referência do cuidado para com o Povo. Aqui e além, a sua fragilidade humana, mas sem lhe faltar a humildade para pedir perdão e interceder junto de Deus a favor do povo. A expectativa messiânica assenta na figura de David, o que há de ser, o Messias que está para vir, é um novo David ou filho de David, será um rebento de Jessé (pai de David). Em Domingo de Ramos, na entrada triunfal em Jerusalém, Jesus é aclamado como filho de David, isto é, o Messias prometido, agora reconhecido como tal.
       Com efeito, o Pastor por excelência é o próprio Deus. Eu próprio irei para o meio do Meu povo, como pastor que apascenta o seu rebanho. Belíssimo o salmo com que hoje respondemos à Palavra de Deus: «O Senhor é meu pastor: nada me falta. Leva-me a descansar em verdes prados, conduz-me às águas refrescantes e reconforta a minha alma...não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo: o vosso cajado e o vosso báculo; me enchem de confiança».
       3 – O Messias de Deus, Cristo Jesus, assume-Se como o Bom Pastor, a Porta pela qual entram as ovelhas, o Porteiro que abre a porta às ovelhas. Como Pastor, conhece cada ovelha pelo nome, levando aos ombros as que andam cansadas e abatidas, para que nenhuma se perca. As ovelhas, por sua vez, conhecem a voz do Seu Pastor, seguem a Sua voz, porque sabem que Ele as trata bem. «Eu vim para que as minhas ovelhas tenham vida e a tenham em abundância».

       4 – O mês de maio desafia-nos a olhar com mais atenção para Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe. O primeiro dia do mês é dedicado às Mães, com uma referência muito peculiar a Santa Maria Mãe de Deus. N'Ela, as características que queremos encontrar nas nossas mães: a candura, a doçura, a capacidade de nos amar em todas as circunstâncias, de nos desculpar e justificar, a diplomacia para a paz e para unidade na família, defendendo-nos com unhas e dentes, procurando a harmonia na família, o diálogo, a disponibilidade para o esforço e sacrifício, para sofrer em nossa vez, a humildade e, em muitas situações, a sujeição à humilhação.
       A vida de Maria mostra-nos a Sua delicadeza para com aqueles que precisam de ajuda, exemplo disso a pressa em ir ao encontro de Isabel ou a intervenção junto de Jesus para agir em favor dos noivos de Caná da Galileia; prontidão para se inteirar da vida do Filho, como quando lhe trazem más notícias. Respeita a Hora do Filho mas mantém-se por perto, vigilante.
       Pelos frutos se veem as árvores. Jesus não nasceu do ar, como extraterrestre, é de carne e osso. Ele aprendeu a ser delicado com os Seus pais, Maria e José. Com o Pai, o trabalho, a profissão, os valores do respeito e da honra, da palavra dada e do compromisso. Com a Mãe, a atenção aos outros, a doçura, a humildade, o olhar terno e a capacidade de se colocar – tanto quanto possível – no lugar dos outros, com as suas necessidades e dúvidas.
       A história bíblica vai-nos mostrando que Deus é Pai que nos ama com amor de Mãe. Jesus transparece a beleza e a misericórdia de Deus Pai, nas palavras, na postura, nas imagens utilizadas na pregação, nos gestos assumidos. O seu último desejo, contudo, aponta para a Maria, dando-no-l'A por Mãe, assumindo-nos como irmãos, afiliando-nos a Maria: Eis a tua Mãe. Eis o teu filho.

       5 – São Pedro, na primeira como na segunda leitura, falando e escrevendo, procura envolver-nos na salvação revelada e realizada por Jesus Cristo que veio de Deus para nos salvar, para nos reunir e congregar. Passou fazendo o bem, sofrendo por todos nós. E por nós foi crucificado.
       A Sua postura é de bondade. Não responde com violência à violência de que é vítima. «Ele suportou os nossos pecados no seu Corpo, sobre o madeiro da cruz, a fim de que, mortos para o pecado, vivamos para a justiça: pelas suas chagas fomos curados. Vós éreis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes para o pastor e guarda das vossas almas».
       Ele deu-nos o exemplo. Para que, imitando-O, morrendo n'Ele o que em nós é obscuro, pecado, inveja, revolta, vontade de vingança, com Ele possamos ressuscitar na alegria e na paz, na justiça e na verdade, na relação franca e transparente. O batismo sinaliza a nossa conversão e o compromisso permanente em sermos dóceis ao Espírito Santo que recebemos, ao espírito de filhos adotivos, para que a graça de Deus em nós produza abundantes frutos de redenção e de bênção.
       Que o Espírito Santo, que nos habita, nos inspire à abertura do coração, à confiança na bondade dos outros, nos impele a despregar-nos da ansiedade doentia, do medo e das expectativas que nos tolhem na relação entre nós. Que a cuidado e delicadeza do Bom Pastor e a ternura e o amor da Virgem Mãe nos faça mensageiros da paz e da alegria e construtores de um mundo saudável e fraterno, inclusivo, acolhendo as diferenças que nos enriquecem, promovendo a dignidade que nos irmana como filhos amados de Deus.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Atos 2, 14a. 36-41; Sl 22 (23); 1 Pedro 2, 20b-25; Jo 10, 1-10.

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