sexta-feira, 18 de setembro de 2015

XXV Domingo do Tempo Comum - ano B - 20.09.2015

       1 – Morte e Ressurreição. Eis o mistério maior (e único) da nossa fé cristã. Em cada domingo, os cristãos celebram a Páscoa semanal, mas também em cada Eucaristia, sacramento no qual Jesus Se faz presente sob as espécies do vinho e do pão que pelo Espírito Santo Se transformam no Seu Corpo e no Seu Sangue. Oferenda que se torna atual no Sacramento da Eucaristia.
       No Evangelho, Jesus, muito cedo, anuncia este mistério: «O Filho do homem vai ser entregue às mãos dos homens, que vão matá-l’O; mas Ele, três dias depois de morto, ressuscitará».
       Apesar da Confissão de Fé, feita por Pedro em nome de todos, dos discípulos daqueles dias e de hoje, que somos nós, há ainda um longo caminho a percorrer, para amadurecer a fé, para perceber a vontade de Deus, para aperfeiçoar a identificação com Jesus e com o Seu Evangelho de serviço sem fronteiras.
       O anúncio da morte, e a chegada iminente do reino de Deus, leva os discípulos a discutir lugares, para ver quem ganhará a dianteira. Haveria alguns candidatos óbvios: Tiago e João, André e Pedro, Judas Iscariotes (um dos mais próximos de Jesus e com maior preponderância no grupo, sendo o responsável pelas economias e pela gestão logística das jornadas missionárias). Os Evangelhos (cf. Mc 10, 35-45; Lc 22, 24-27; Jo 13, 1-17) mostrar-nos-ão como Tiago e João solicitam a Jesus os lugares à Sua direita e à Sua esquerda. Este facto foi ligeiramente modificado por São Mateus (20, 20-28) que coloca a mãe dos dois a pedir, protegendo-os desta pretensão e ousadia. Esse episódio ser-nos-á apresentado daqui a quatro domingos, na versão de São Marcos.
       2 – O caminho serve para evangelizar. Mas por vezes Jesus deixa que os discípulos conversem e só os interpela em casa. Faz-nos lembrar aquelas famílias, cujos filhos vão discutindo sem que os pais intervenham, a não ser mesmo necessário, e quando chegam a casa aproveitam e esclarecem algum ponto, rebatendo ou alertando para alguma situação menos positiva. Também assim no contexto de um grupo ou uma turma, os reparos quanto possível devem fazer-se discretamente e de preferência individualmente. Neste caso, todo o grupo está em causa. Precisam de amadurecer ideias. Jesus deixa porquanto que discorram entre eles.
       O evangelista refere que os discípulos estavam com receio em interrogar Jesus. Talvez por saberem o que Ele pensava. Mas querem tirar a limpo. Têm que arriscar. Vimos como Pedro repreendeu Jesus quando Ele anuncia a Sua morte para breve. Vê-se agora que a repreensão a Pedro é extensível a todos os discípulos. Se se aproxima a hora da morte de Jesus, há que assegurar o futuro sem Jesus. Pelo caminho vão jogando uns com os outros sobre as cartadas de cada um: qual deles é o maior e que pode assumir um lugar de destaque?
       Enquanto discutem lugares, Jesus chega-lhes a mostarda ao nariz para lhes recordar a missão do Filho do Homem que veio para servir e não para ser servido, veio para dar a vida pela humanidade. O serviço é o único caminho do discípulo. Quem quiser segui-l'O tem de correr atrás de Jesus, seguindo os Seus passos, de serviço e de auto oferenda pelos outros. O caminho do amor passa pela cruz. Aquele que ousar desviar-se da Cruz de Jesus, perde-se a si mesmo, pois não há amor que não acarrete preocupação, serviço, dedicação ao outro e até dar a própria vida pela vida de quem se ama. Qual o pai que não daria a vida pelo seu filho? Qual o pai que amando não sofre?
       Mas se não há caminho cristão sem cruz, também não o há sem serviço, sem humildade, sem a pequenez que deixa transparecer a grandeza de Deus.
       Jesus chama-os, reúne-os à Sua volta – Cristo deve estar sempre no centro, no meio, Ele preside – e senta-se. É a atitude de quem ensina. E diz-lhes: «Quem quiser ser o primeiro será o último de todos e o servo de todos». E, para que não haja dúvidas, Jesus toma uma criança, coloca-a no MEIO deles, abraça-a e sublinha: «Quem receber uma destas crianças em meu nome é a Mim que recebe; e quem Me receber não Me recebe a Mim, mas Àquele que Me enviou».
       Curioso: eles discutem o futuro para o tempo em que Jesus não está; Jesus propõe-lhes um futuro em que estará sempre no MEIO, em carne e osso, pelo Espírito Santo, ou pelos mais pequenos do Reino. Não são os discípulos que devem ocupar o MEIO mas aqueles que eles devem servir.
       3 – Como cristãos, levando a sério a mensagem do Evangelho, o dizer e o fazer de Jesus, conduzir-nos-á a disputar a caridade, o serviço, a atenção, o cuidado aos outros. Assim o rezamos: «Senhor, que fizestes consistir a plenitude da lei no vosso amor e no amor do próximo, dai-nos a graça de cumprirmos este duplo mandamento, para alcançarmos a vida eterna» (coleta).
       Na igreja, a discussão há de andar à volta das situações que é necessário atender.
       São Tiago volta a ser muito pragmático a propósito: «Onde há inveja e rivalidade, também há desordem e toda a espécie de más ações. Mas a sabedoria que vem do alto é pura, pacífica, compreensiva e generosa, cheia de misericórdia e de boas obras, imparcial e sem hipocrisia. O fruto da justiça semeia-se na paz para aqueles que praticam a paz. De onde vêm as guerras? De onde procedem os conflitos entre vós? Não é precisamente das paixões que lutam nos vossos membros? Cobiçais e nada conseguis: então assassinais. Sois invejosos e não podeis obter nada: então entrais em conflitos e guerras. Nada tendes, porque nada pedis. Pedis e não recebeis, porque pedis mal, pois o que pedis é para satisfazer as vossas paixões».
       A inveja desmedida e a ganância são contrárias à sabedoria que vem de Deus. A própria oração pode ser contraproducente quando esquece Deus e esquece os outros. No evangelho o caminho do serviço é o único caminho do discípulo de Jesus. Do mesmo jeito, São Tiago nos vai lembrando que a fé nos compromete com a justiça, com a paz, com as boas obras, com a solidariedade e serviço aos mais desfavorecidos.

       4 – Servidores mas não ingénuos. Seguir Jesus e a vontade de Deus coloca a possibilidade efetiva da cruz, da perseguição. Assim o descreve o sábio: «Armemos ciladas ao justo, porque nos incomoda e se opõe às nossas obras; censura-nos as transgressões à lei e repreende-nos as faltas de educação. Vejamos se as suas palavras são verdadeiras, observemos como é a sua morte. Porque, se o justo é filho de Deus, Deus o protegerá e o livrará das mãos dos seus adversários. Provemo-lo com ultrajes e torturas, para conhecermos a sua mansidão e apreciarmos a sua paciência. Condenemo-lo à morte infame, porque, segundo diz, Alguém virá socorrê-lo».
       A justiça e a verdade, a luz e a retidão, a honestidade e a bondade, podem provocar sentimentos contraditórios e reações diversas. Uma pessoa boa pode ser vista como um ataque a todos aqueles que caminham por caminhos tortuosos de pecado. A luz é inimiga das trevas. As trevas escondem e protegem o mal. A luz não faz mal, sublinha o bem, ainda que possa pôr a claro o mal. Aquele que segue o caminho do bem e da verdade dificilmente se livrará da cruz. Amar, servir, ressuscitar, ser feliz, não são meras conjugações verbais mas opções de vida e que são passíveis de acarretar sofrimento, dor, sacrifício. Quem se sujeita a amar sujeita-se a padecer.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (B): Sab 2, 12. 17-20; Sl 53 (54); Tg 3, 16 – 4, 3; Mc 9, 30-37.

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