sábado, 12 de julho de 2014

XV Domingo do Tempo Comum - ano A - 13.julho.2014

       1 – «Saiu o semeador a semear. Quando semeava, caíram algumas sementes ao longo do caminho: vieram as aves e comeram-nas. Outras caíram em sítios pedregosos, onde não havia muita terra, e logo nasceram, porque a terra era pouco profunda; mas depois de nascer o sol, queimaram-se e secaram, por não terem raiz. Outras caíram entre espinhos e os espinhos cresceram e afogaram-nas. Outras caíram em boa terra e deram fruto: umas, cem; outras, sessenta; outras, trinta por um».
       Belíssima sonoridade na leitura/escuta da parábola do Semeador que sai a semear e cuja semente encontra terrenos diferentes. Jesus sai de casa e vai sentar-se à beira-mar. A multidão aproxima-se e Jesus sobe para um barco, para que todos tenham oportunidade de O ver e de O ouvir. Conseguimos colocar-nos entre a multidão, ávidos da Palavra de Jesus? E na primeira fila, como os discípulos daquele tempo? Procurando perceber tudo quanto Jesus nos quer dizer?
       Depois da intervenção de Jesus, os discípulos interrogam-n’O sobre a opção de falar em parábolas. A troca de palavras é um desafio à escuta atenta e à disponibilidade para viver segundo a Palavra de Deus. Os ouvidos endurecidos daquele Povo, e de todos os povos, impedem de ouvir. Mas é a missão de Jesus, e dos discípulos, levar a todos o amor de Deus.
       Por outro lado, Jesus sublinha também o facto de aos discípulos ter sido dado a graça de contemplar o mistério de Deus, há tanto desejado pelos profetas, a presença de Deus no meio do povo e da história. É também, por conseguinte, um desafio para que não desperdicemos o DOM que nos é oferecido em Jesus Cristo.
       2 – A parábola que Jesus nos propõe pode sugerir diversas interpretações, aliás, é próprio da parábola deixar espaço para que cada um tire lições para a sua vida ou para a vida da comunidade.
       Antes de qualquer interpretação, a explicação de Jesus:
«Quando um homem ouve a palavra do reino e não a compreende, vem o Maligno e arrebata o que foi semeado no seu coração. Este é o que recebeu a semente ao longo do caminho. Aquele que recebeu a semente em sítios pedregosos é o que ouve a palavra e a acolhe de momento com alegria, mas não tem raiz em si mesmo, porque é inconstante, e, ao chegar a tribulação ou a perseguição por causa da palavra, sucumbe logo. Aquele que recebeu a semente entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo e a sedução da riqueza sufocam a palavra, que assim não dá fruto. E aquele que recebeu a palavra em boa terra é o que ouve a palavra e a compreende. Esse dá fruto e produz ora cem, ora sessenta, ora trinta por um».
       Como acontece em outras parábolas, o significado parece dividir os bons e os maus, os pobres e os arrogantes, os ouvintes e os mudos à Palavra de Deus. Porém, quando Jesus fala dirige-se a todos. E todos somos chamados a escutar e a levar à prática as Suas palavras. Somos discípulos. Engrossamos a multidão. E entre a multidão há muitas motivações e justificações. Uns porque sim. Outros arrastados pela maioria. Uns por curiosidade, outros por fé. Uns despertos na esperança, outros céticos em tudo o que vai além da comida e da bebida. Também assim connosco.
       Por outro lado, somos nós ao longo da vida, umas vezes entusiasmados com a Palavra de Deus, mas em nada alteramos a nossa vida; outras vezes não prestamos atenção, porque andamos preocupados com muitas coisas. O ideal é que sejamos terra fértil em que a palavra de Deus frutifique ora cem, ora sessenta, ora trinta por um. Ponhamos os talentos a render. Se guardamos a vida para nós, por receio de não sermos suficientemente compensados ou por que não queremos ser bonzinhos e outros possam escarnecer da nossa generosidade, então desperdiçamos a vida. Guardar os dons, atrofia-nos, deixa-nos raquíticos. Limitamos a vida ao mínimo e Jesus chama-nos à abundância.
       3 – A experiência vai-nos ensinando a não ser ingénuos. E muito bem!? A ingenuidade faz-nos agir antes de pensar e de fazer calculismos sobre perdas e valores. Com o passar do tempo, dizemos, aprendemos, tornamo-nos mais inteligentes e talvez mais sábios. Por isso já não nos deixamos enganar com a mesma facilidade de antes. Fechamo-nos mais. Afastamos as pessoas com mais destreza ou mantemo-las fora dos nossos afetos. Não nos magoamos do mesmo jeito, temperamos as emoções e os sentimentos.
       A sabedoria faz-nos ultrapassar a ingenuidade, mas destrói também o nosso altruísmo e generosidade, pouco a pouco tornamo-nos cínicos. Logo arrogantes e mais à frente lobos solitários. O medo de sermos enganados e de que gozem com a nossa boa vontade, levar-nos-á a ser cautelosos e calculistas. Obviamente que a vida não é branco e preto, mas multicolor, e uma descrição não encaixa em todos.
       Quem anda à chuva molha-se, ou pode molhar-se. Se a escolha é ficar em casa, na sua concha, então não se molha mas também não experimenta a densidade da chuva, ou como sabe bem chapinhar na água, ou apreciar o sol a enxugar a nossa roupa ensopada!
       Como refere o Apóstolo, na segunda leitura, vivemos na certeza da eternidade de Deus, que não anula a nossa fragilidade e pertença ao mundo histórico e temporal. A convicção temperada que existe sol mesmo quando o Céu está escuro que nem breu dá-nos confiança para avançar. "Os sofrimentos do tempo presente não têm comparação com a glória que se há de manifestar em nós... Sabemos que toda a criatura geme ainda agora e sofre as dores da maternidade". Vivemos no mundo, ainda que renovados pelo Espírito que nos impele para acolhermos o reino de Deus, expandindo-o à nossa volta.

       4 – A Palavra de Deus mostra-nos claramente que Deus é o Senhor do tempo e da história, da vida e do mundo. Criou-nos livres e ama-nos absolutamente, como o Pai/Mãe ama os filhos. Não Se alheia de nós. O salmista convida-nos a rezar confiantes: «Visitastes a terra e a regastes, enchendo-a de fertilidade. As fontes do céu transbordam em água e fazeis brotar o trigo. Coroastes o ano com os vossos benefícios, por onde passastes brotou a abundância. Vicejam as pastagens do deserto e os outeiros vestem-se de festa». Vale mais quem Deus ajuda do que quem madruga. Sem Deus nada, com Deus tudo. Só Deus basta!
        Deus conta connosco. Predispomo-nos a acolher a semente, a Palavra de Deus, a Sua misericórdia. Ele é o Semeador. A Sua Palavra a semente. Nós a terra. Ele age. Quer atuar em nós e através de nós. A garantia: «Assim como a chuva e a neve que descem do céu não voltam para lá sem terem regado a terra, sem a terem fecundado e feito produzir, para que dê a semente ao semeador e o pão para comer, assim a palavra que sai da minha boca não volta sem ter produzido o seu efeito, sem ter cumprido a minha vontade, sem ter realizado a sua missão».
       O Senhor Deus garante a Sua presença e ação no mundo. Cabe-nos criar as condições para que o fruto se multiplique. O reino de Deus avança pela força do amor de Deus. Embarcamos? Ou ficamos a ver a água a passar?

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Is 55, 10-11; Sl 64 (65); Rom 8, 18-23; Mt 13, 1-23.

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