sábado, 15 de outubro de 2011

XXIX Domingo do Tempo Comum - 16 de Outubro

       1 – Na Viagem Apostólica à Alemanha, Sua terra natal, o Papa sublinhou a necessidade da Igreja ser livre face aos bens materiais e à política, para que cumpra com a sua missão primordial que é anunciar e testemunhar Jesus Cristo e o Seu Evangelho de justiça, de perdão e de amor, de partilha, solidariedade e comunhão, abrindo os corações para a dimensão espiritual, sobrenatural, transcendente da vida, sustentando a esperança que nos coloca em Deus, na confiança que nos compromete com os outros, no mundo e na história actuais.
       Bento XVI diz-nos clara e inequivocamente que a Igreja "para cumprir a sua missão, ela deverá continuamente manter a distância do seu ambiente, deve por assim dizer «desmundanizar-se»", não cedendo às “pretensões e condicionamentos do mundo”.
       “A Igreja deve abrir-se incessantemente às inquietações do mundo e dedicar-se a elas sem reservas”, e não se deixar levar por “uma tendência contrária, ou seja, a de uma Igreja que se acomoda neste mundo”.
       Por outro lado, diz-nos Bento XVI, “as secularizações – sejam elas a expropriação de bens da Igreja, o cancelamento de privilégios, ou coisas semelhantes – significaram sempre uma profunda libertação da Igreja de formas de mundanidade... Uma Igreja aliviada dos elementos mundanos é capaz de comunicar aos homens, precisamente no âmbito sócio caritativo – tanto aos que sofrem como àqueles que os ajudam –, a força vital particular da fé cristã”.
       2 – Até Jesus chegam diversos questionamentos, alguns correspondem a uma busca sincera, outros a intentos para Lhe armarem ciladas, como acontece no Evangelho de hoje. Alguns fariseus, doutores da lei, herodianos (=partidários de Herodes), procuram armar-Lhe uma ratoeira: "É lícito ou não pagar tributo a César?".
       A resposta precisa de ponderação e sabedoria. Se Jesus dissesse que não deveriam pagar tributo a César, isso seria motivo mais que suficiente para ser acusado de estar contra o imperador e as autoridades romanas que impunham a ordem. Se dissesse que se deveria pagar a César ficaria a clara impressão que Ele não defendia os judeus mas os romanos. Saliente-se desde logo como se juntam algumas facções que nem se dava assim tão bem, mas protegem-se uns aos outros.
       Vejamos então como é sábia a réplica de Jesus: "Mostrai-me a moeda do tributo... De quem é esta imagem e esta inscrição... Então, dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus".
       Ao longo da história da Igreja (e da humanidade) muitas foram as ocasiões em que o poder do mundo se confundiu com o "poder" (que deveria ser serviço) religioso. Por vezes aliaram-se, apoiaram-se, e garantiram mutuamente o poder e a predominância sobre os demais, não como quem serve, à maneira de Jesus, mas como quem coloca pessoas, comunidades e países inteiros ao serviço dos seus interesses pessoais e/ou familiares.
       Quantas disputas, a ver quem mandava mais, se o rei ou o bispo?! Quantas vezes, o poder político se encostou à Igreja e à religião? Quantas vezes, a Igreja se colou ao poder político, beneficiando de apoios, umas vezes mais pessoais, outras vezes a favor das comunidades?
       Jesus di-lo claramente, a cada um a sua missão. Não se contrapõem, também não se confundem. Em todo o caso, a fé, a religião, a Igreja, hão-de posicionar-se diante da política, como dos bens materiais, numa atitude crítica, dando sempre a primazia para o serviço que os poderes públicos podem prestar às pessoas mais fragilizados. O facto de não se confundir, cria um distanciamento favorável à procura de novas respostas e sobretudo de soluções cada vez mais concordes com o Evangelho. O não se comprometer com este ou com aquele regime político, com este ou aquele partido, fazem com que a Igreja seja de todos e para todos, e dê o seu contributo específico para uma sociedade mais justa, mais fraterna, mais solidária, o contributo que radica no Evangelho, na caridade, ou melhor, que radica em Jesus Cristo.

       3 – Como cristãos, a nossa referência primeira, essencial e última, é JESUS CRISTO, verdadeiro e humano rosto de Deus. Já não vivemos nas trevas, na ilusão, no medo. Ele revela-nos o AMOR de Deus por nós, é Deus entre nós, no mundo, no tempo, na história. Não Se resguarda, como Deus omnipotente e todo-poderoso, mas um Deus próximo, Emanuel, Deus connosco. Vem para ficar e nos elevar para Ele.
       Dito de outra forma, a nossa referência não é primeiramente política e ideológica, não somos deste ou daquele grupo social ou político, somos cristãos. É a nossa identidade. Não é uma carapaça que ponhamos em nós, é a nossa alma, a nossa vida, somos nós, filhos de Deus em Cristo Jesus.
       Com o profeta, concluímos que não temos vários deuses, mas um só. "Eu sou o Senhor e não há outro; fora de Mim não há Deus. Eu te cingi, quando ainda não Me conhecias, para que se saiba, do Oriente ao Ocidente, que fora de Mim não há outro".
       Por vezes não sabemos em quem confiar e onde depositar a nossa fidelidade. A este ou aquele partido, a esta ou àquela associação, nesta ou em outra dimensão da vida. Por vezes poderemos colocar a nossa segurança nos bens materiais, ou nas realizações culturais. A fé em Deus, em Jesus Cristo, ajuda-nos a relativizar o mundano, num compromisso que não se desiluda com a caducidade das coisas nem com a fragilidade das pessoas e das suas opções.
       Por outro lado, refira-se, que os cristãos têm o dever moral de se empenharem activamente na transformação do mundo em que vivem, procurando testemunhar os valores que presidem à sua identidade cristã. Um contributo cristão quanto aos valores da vida, da dignidade humana, da opção preferencial pelos mais pobres, da protecção das pessoas mais fragilizadas, a partilha, o perdão, a reconciliação entre pessoas (e realidades), a caridade, entendida como serviço permanente a favor do próximo, ao jeito de Jesus Cristo, como quem se predispõe a dar a vida em cada palavra e em cada gesto.

       4 – O nosso compromisso vai muito além do tempo presente. Isso é muito positivo. Vai até à eternidade. Não se destrói nas desilusões presentes. Compromete-se já, hic et nunc, aqui e agora, com as realidades actuais, mas com um rasto de esperança que nunca desiste, porque sabe que mais à frente vai encontrar-se com Deus.
       Daí que o nosso trabalho, o nosso envolvimento na transformação do mundo e no compromisso com os outros, comece e termine na oração, uns pelos outros e uns com os outros: "A graça e a paz estejam convosco. Damos continuamente graças a Deus por todos vós, ao fazermos menção de vós nas nossas orações. Recordamos a actividade da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança em Nosso Senhor Jesus Cristo, na presença de Deus, nosso Pai. Nós sabemos, irmãos amados por Deus, como fostes escolhidos. O nosso Evangelho não vos foi pregado somente com palavras, mas também com obras poderosas, com a acção do Espírito Santo".
       É pela oração que nos colocamos no coração de Deus e caminhamos como comunidade.

Textos para a Eucaristia (ano A): Is 45,1.4-6; 1 Tes 1,1-5b; Mt 22,15-21.

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